quinta-feira, 9 de junho de 2011

NANOTECNOLOGIA APLICADA AO TRATAMENTO DE ÁGUA

A água é o recurso natural mais abundante na Terra, com um volume estimado de 1,36 bilhões de quilômetros cúbicos, recobrindo dois terços da superfície do planeta sob a forma de oceanos, calotas polares, rios e lagos. A água é essencial à vida, o que significa que todos os organismos vivos, incluindo o homem, dependem dela para sobrevivência. É fundamental, entretanto, que os recursos hídricos apresentem condições físicas, químicas e microbiológicas adequadas para utilização.
           
Antes de chegar à maioria das residências, a água deve receber um tratamento de desinfecção para assegurar a sua qualidade e segurança. No entanto, estudos recentes indicam que existe no mundo em torno de 1 bilhão de pessoas sem acesso a água potável. Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), a cada oito segundos morre uma criança no planeta vítima de doenças relacionadas ao consumo de água contaminada. O relatório foi taxativo: mais pessoas morrem devido ao consumo de água contaminada do que por violência no mundo. De acordo com a Agência Nacional de Águas, 17 milhões de brasileiros ainda não têm acesso a água potável. Segundo a UNICEF, na América Latina e no Caribe cerca de 20 mil crianças morrem antes de completarem cinco anos de idade devido a diarréias agudas, o que poderia ser evitado mediante o acesso a condições de higiene adequadas, infra-estruturar de saneamento e água potável.

O mesmo cenário desolador se verifica no Brasil que ainda vive um momento em que muitos brasileiros não têm acesso à água proveniente de uma estação de tratamento. Em função de sua posição socioeconômica, muitos utilizam água de poços artesanais, rios e outras fontes alternativas, agravando ainda mais o quadro da saúde pública no Brasil. O quadro é particularmente grave nas áreas rurais, onde o percentual de domicílios particulares permanentes não abastecidos com água da rede geral era de 82,2%, enquanto que nas áreas urbanas era de 10,9%. O Nordeste urbano (14,7%) era a região com o segundo pior percentual, atrás apenas do Norte (37%). Já no meio rural apenas 18,3% da população tinha acesso à rede geral de abastecimento, situação pior no Ceará (8%) e na Paraíba (10,3%).
           
A questão da água tem sido foco de ações da ONU e de uma série de ONGs. Assim, o problema tem sido abordado por fundos de Investimentos voltados a ações sociais, políticas públicas de diversos países e mais recentemente com ações privadas de grandes corporações.
           
O método mais utilizado na desinfecção da água envolve a oxidação dos organismos nela presentes pela adição de compostos de cloro. Esse tratamento, no entanto, depende de uma disponibilidade do agente químico que é consumido no processo e, além disso, leva à formação de compostos indesejados e nocivos ao homem e ao ambiente. Tratamentos a base de ozônio, AgNO3, luz ultravioleta e outras formas de radiação pode ser também usados, porém apresentam efeitos colaterais na saúde humana, além de inconvenientes causados por sobredosagem.

Visando a oferecer soluções seguras e de grande alcance no meio da população carente, um número significativo de iniciativas tem lançado mão da nanotecnologia como ferramenta efetiva e de baixo custo para endereçar esse grande desafio do século 21. Em comum as soluções apresentadas utilizam nanotecnologia, entretanto, o meio e a forma de atuação são bastante distintas:
           
Na Índia, país que enfrentam problemas de abastecimento de água semelhante ao do Brasil, foi divulgada a utilização de princípios de nanotecnologia para purificação de água direcionada à população carente. Trata-se de um filtro, chamado de swach, desenvolvido pelo Grupo Tata, que usa cinzas de casca de arroz impregnadas com nanopartículas de prata.
           
Em vários outros países do terceiro mundo, a organização não governamental Potters for Peace tem auxiliado, desde 1998, a produção de purificadores de água cerâmicos a base de prata coloidal. Experiência de campo e testes clínicos tem mostrado que estes filtros eliminam >99,9% de agentes patogênicos presentes na água.
           
Em consonância com as soluções ilustradas, pretende-se utilizar da nanotecnologia, considerando duas formas distintas e eventualmente complementares de abordar o problema: o uso de dióxido de titânio sob a ação de radiação UV e o uso de nanopartículas e nanofilmes de prata como agente bactericida na desinfecção da água. A competência gerada no emprego dessas duas abordagens no estudo e a caracterização de novos materiais cerâmicos funcionalizados abrirá oportunidades para o desenvolvimento de soluções criativas voltadas para a realidade brasileira.
           
A ação fotocatalítica do dióxido de titânio (TiO2) sob a ação de radiação UV proveniente da luz solar tem sido estudada há cerca de 35 anos. A fotocatálise heterogênea é um processo de descontaminação vantajoso, pois é capaz de realizar degradar poluentes orgânicos e inorgânicos. Além disso, a sensibilidade de um fotocatalisador à luz UV de grandes comprimentos de onda permite que a reação seja realizada com sucesso em países de grande incidência solar como o Brasil.
           
O efeito é potencializado pelo emprego de partículas de titânia na faixa nanométrica. Além disso, há um efeito sinergético pelo uso simultâneo de nanopartículas de titânia e prata.

Filmes de TiO2 modificados por deposição de prata foram testados para a degradação fotocatalítica de substancias orgânicas, com aumento de eficiência de ~100% em relação ao filme original sem prata.
           
Nanopartículas ou nanofilmes de prata impregnados em elementos de filtro constituem-se em um enorme reservatório de íons prata que em contato mecânico com as bactérias são liberadas de forma controlada e com ação fatal sobre as bactérias.
           
Diversos estudos têm demonstrado atividade bactericida de nanoprata contra 16 espécies de bactérias, dentre elas as patogênicas como Staphylococcus aureus, Salmonella typhy, Escherichia coli e Vibrio cholerae. A impregnação de Ag em filtros de água tem sido bastante eficaz no esforço de reduzir a presença de patogênicos.
           
Nanopartículas de Ag aplicadas na superfície de filtros de espumas de poliuretano se mantiveram estáveis e não foram lavadas pelo fluxo de água, possivelmente devido a sua interação com os átomos de nitrogênio do poliuretano. Ao tratar água contaminada com Escherichia coli a 105 UFC/mL com filtro de espuma de poliuretano impregnado com NPs, a uma taxa de fluxo de água de 0.5 L/ min foi observado que ao passo de poucos segundos, a contagem de E. coli ficou abaixo do limite de detecção.
                       
Filtros de cerâmica impregnados com nanoprata foram recentemente usados em laboratório para testar o tratamento de água de uso domiciliar. Os filtros removeram 97.8% a 100% da quantidade inicial de E. coli. Estes resultados mostram que o uso de filtros de cerâmica impregnados com nanoprata são efetivos e sustentáveis quando aplicados na tecnologia de tratamento de água.
           
Métodos de tratamento de água de consumo com base em processos catalíticos potencializados com o uso da nanotecnologia podem ser alternativas de baixo custo e de alta eficiência para os métodos tradicionais, em particular em regiões carentes e de acesso limitado a outras técnicas, como nas regiões do semi-árido brasileiro.
           
Frente a todos estes fatos, faz-se necessário o estudo de novas tecnologias para o tratamento da água, tanto para ser utilizado nas estações de tratamento, quanto para levar água potável a quem ainda não tem acesso. Os problemas relacionados ao tratamento e a qualidade da água, portanto, caracterizam os maiores problemas que estão sendo abordados pela Rede de que fazem parte UFSC, UFRN, UNAERP, IPEN e a empresa TNS, no projeto de pesquisa “Processamento e caracterização de superfícies funcionalizadas com nanopartículas antimicrobianas para tratamento de água", referente ao Edital MCT/CNPq nº 74/2010 – Nanociência e Nanotecnologia.

Cesar Franco/UFSC
Dachamir Hotza/UFSC

Um comentário:

  1. existe algum resultado que evidencia a utilização desta tecnologia para o tratamento de água em grande abundancia?

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